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terça-feira, 8 de março de 2016

FESTA DO SANFONEIRO ------ COMUNICAÇÃO E COMUNIDADE 2016 - SODEPRO ( Sociedade em Defesa e Progresso da Bela Vista )

Sanfoneiros expressam a cultura do povo sertanejo



Antônio Vicelmo

O ronco da sanfona de Luiz Gonzaga ainda ecoa nas quebradas do sertão num lamento nordestino carregado de dor, sofrimento e alegria. É o sertão em corpo e alma que se manifesta na voz do mais autêntico sanfoneiro do riacho da Brígida, mostrando para o Brasil e o mundo os usos e costumes de uma gente simples que não se intimida diante da adversidade. Essa paixão do Rei do Baião pelo Nordeste se imortaliza na vocação inata de uma gama de nordestinos que segue o seus passos, puxando sanfonas e harmônicas de oito baixos, nos terreiros das fazendas, nos sambas de pé de serra e nos mais sofisticados salões. É a autêntica música sertaneja que se eterniza na arte e genialidade de sucessivas gerações.

Um dos seguidores do velho Lula é Clóves Jaime Aires de Alencar Carvalho , conhecido por “Jaimim” que embalou seus sonhos de menino, ouvindo Gonzagão. Jaimim tem motivos de sobra para ter Luiz Gonzaga como ídolo. Ele nasceu e cresceu na fazenda Araripe, Município de Exu, onde também nasceu e viveu Luiz Gonzaga em terras de seus avós. Jaimim e Gonzagão são frutos da mesma terra, rebentos da mesma árvore genealógica, muito embora de camadas sociais diferentes.

A admiração do jovem sanfoneiro por Luiz Gonzaga vai além da música. Seu bisavô, Coronel Aires, foi patrão e amigo de Luiz Gonzaga. Hoje com 19 anos, se preparando para fazer o vestibular, Jaimim é uma das mais promissoras revelações da casta de sanfoneiros da região. É convidado para tudo quanto é de festa. Entretanto, ao contrário de Luiz que fugiu de casa com a coragem e a cara para conquistar o mundo com sua sanfona, Jaimim tem um compromisso com o estudo. “Será um sanfoneiro, um artista, doutor, com o anel no dedo”. Este é o seu desejo.

Inconscientemente, Jaimim está seguindo o mesmo caminho de Zé Dantas, um dos maiores parceiros de Gonzagão, autor de sucessos como “O Xote das Meninas”. Zé Dantas foi médico ginecologista e compositor, assim como Humberto Teixeira, que era advogado. Jaimim já tocou ao lado de Gilberto Gil e Dominguinhos que o reconhecem como um dos valores da nova geração de sanfoneiros.

O sanfoneiro e funcionário aposentado da Fundação Oswaldo Cruz, João Julião, que reside em Crato, na Rua Theopisto Abath, 271, guarda com carinho uma relíquia: uma sanfona preta que lhe foi doada pelo Rei do Baião. João Julião tem uma ligação afetiva com Luiz Gonzaga. Seu pai, João Julho do Nascimento, tocou harmônica de oito baixos, com o velho Januário, pai de Luiz Gonzaga. Hoje, com 69 anos, Julho lembra que ensaiou muitas músicas com Gonzagão.

Na década de 70, teve uma surpresa: recebeu uma sanfona de presente do Rei. ”Seu Luiz, eu não sei como vou lhe pagar essa sanfona”, disse emocionado ao receber o presente. E Gonzagão respondeu: “a sanfona já está paga, tenta ganhar a vida com ela”. Era mais uma das muitas sanfonas que Luiz Gonzaga doou a jovens e velhos sanfoneiros que hoje seguem a sua pisada.

João Julião, que é autor de várias músicas, algumas delas gravadas, tem uma verdadeira veneração por Luiz Gonzaga. Compôs algumas músicas, cuja letra lembra a parceria de seu pai com Januário. Numa delas ele diz que todo sanfoneiro, mesmo sem querer, é imitador do Rei do Baião. Uma sanfona, uma saudade eterna e uma gratidão. É assim que Julião curte os velhos tempos de sanfoneiro.

No rastro de Luiz Gonzaga caminha também a banda Flor de Pequi formada por integrantes da banda cabaçal dos Irmãos Anicetos. É o forró puro na base da sanfona, do triângulo e do zabumba, com cheiro de baião-de-dois com pequi e paçoca feita em pilão. O sanfoneiro Cícero Aniceto que, na banda cabaçal, faz questão de conservar a tradição dos índios Cariri, de quem o grupo descende, no puxado da sanfona mantém-se fiel ao ritmo de Luiz Gonzaga.

E assim o melhor estilo Gonzagão vai se espalhando no vale, revelando valores que se projetam por este Brasil afora como é o caso de Hugo Linard do Crato e Chico de Amadeu, de Várzea Alegre, dois dos maiores acordeonistas do Ceará. A maioria deles, entretanto, vive no anonimato, fazendo seus shows particulares no meio das feiras e nas bodegas e bares do Interior.

Entre estes, estão os sanfoneiros Peneirinha, Passarinho e Luiz, que todas as segundas-feiras se revezam no bar Maravia, localizado na rua Pedro II, em frente a Prefeitura do Crato, tocando de graça para os freqüentadores do bar. No final da feira, os três artistas conseguem uma renda média, dada de forma voluntária, de R$ 50,00.

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